A vida normal não vai voltar. Talvez você esteja no luto continuado dessa pandemia que não termina ou tenha a sorte de não ter perdido ninguém. Mas aí você vai ali numa loja que gostava e não a encontra mais. A dona pegou covid e morreu. O marido assumiu a loja, pegou covid e morreu logo depois. A filha sobreviveu, mas decidiu fechar as portas. "Aqui nessa rua, ó, fechou tudo", você vai ouvir. Números de celulares desconectados. Órfãos, viúvos precoces. Gente abalada demais pra ser simpática. Isso é a vida normal a partir de agora.
Nem deu pra juntar os cacos, o que resta de nós precisa continuar. Sem parar pra pensar, ainda temos que conviver com o coronavírus nessa grande fábrica de variantes, com a crise econômica, o pesadelo medonho do governo federal e seus efeitos a cada esquina.
Do alto do privilégio de ter passado quase ilesa pela covid, de ter a família poupada e ostentando bravamente a primeira dose no braço, queria vir aqui te oferecer, querido leitor ou leitora, uma palavra de consolo se você estiver triste com ou sem motivo aparente, se você também está achando pesado ser protagonista desse momento histórico que nem te perguntou se você aceitava participar da trama.
Queria ter vindo antes, queria estar disponível pra mais gente. Mas a verdade é que estou usando tudo o que tenho. Amparando quem eu posso, brigando com quem consigo, distribuindo um dinheirinho aqui e ali pra ajudar, segurando minha própria onda. Porque mesmo no modo super easy da pandemia, não tá fácil. A vida ao meu redor finge que está tudo bem, mas lá estou eu com o coração aos pulos acompanhando boletins médicos, números que sobem rápido demais, que avançam com muito custo, tentando esquecer de tudo que a gente tem saudade e ainda não dá pra fazer. Nem sonho mais com carnaval. Por enquanto, me basta mais um dia.